O documento interno do DMI do BES, a que o PÚBLICO teve acesso, é datado de 24 de Março e tem uma assinatura ilegível acompanhando as palavras manuscritas “de acordo” com a data da decisão de dia 26 do mesmo mês. Lê-se que o PCP “solicita que o BES mantenha o apoio à realização da Festa do Avante (que ocorre este ano nos dias 5, 6 e 7 de Setembro), nomeadamente [com um] donativo no valor de 11 mil euros”.
De acordo com a lei do financiamento dos partidos, é proibido às empresas e outras entidades colectivas fazer donativos aos partidos políticos, sendo mesmo considerado um ilícito criminal e punido com pena de prisão entre um e três anos, tanto para quem paga como para quem, do lado do partido, o recebe.
A lei do financiamento dos partidos políticos (LFPP) é clara: “Os partidos políticos não podem receber donativos anónimos, nem receber donativos ou empréstimos de natureza pecuniária ou em espécie de pessoas colectivas nacionais ou estrangeiras [com excepção de pedidos de empréstimos normais junto de instituições bancárias].”
O PCP, questionado pelo PÚBLICO, afirma que a Festa do Avante! “não solicitou nem teve qualquer apoio financeiro do BES”, nem fez “qualquer pedido de donativo a esta ou qualquer outra entidade privada”. Aquilo que existiu entre o partido e o BES para a Festa do Avante! foi apenas a contratação de um “conjunto de serviços”, pelo qual a organização do evento “pagou mais de 20 mil euros no ano presente que serão inscritos nas contas do PCP, a enviar ao Tribunal Constitucional, como despesa”.
“A relação que a Festa do Avante! detém com o BES/Novo Banco é estritamente de natureza comercial, com a contratação dos serviços mencionados, nas condições apresentadas pelo próprio banco”, afirma o PCP, sem especificar, apesar de inquirido sobre essas condições. "Ao contrário do que é sugerido nas perguntas [enviadas pelo PÚBLICO ao PCP], salienta-se que na relação comercial com o BES, outros bancos e diversas entidades a que a Festa do Avante! tem de contratar serviços, são estas que efectivamente têm proveito da relação estabelecida como acontece com a generalidade dos clientes.”
Quem no Departamento de Municípios e Institucionais do BES elaborou o documento afirma que “o valor do donativo encontra-se previsto no orçamento do Departamento de Comunicação para o corrente ano na rubrica de ATM [conhecidas como caixas multibanco para levantamento e depósito de dinheiro]”.
Descreve-se também que o PCP diz que pretende instalar no recinto da festa diversos equipamentos e serviços pelos quais o partido “pagará cerca de 23 mil euros” ao banco. A saber: instalação de oito caixas multibanco com piquete de assistência, de 200 terminais de pagamento móveis (para pagamento por cartão) e de cofres nocturnos; assim como o transporte e tratamento de valores e uma máquina de contar notas e moedas.
“Descontos” na factura
A referência do próprio banco de que o “donativo” se encontrava “previsto” na rubrica de ATM deixa antever que o apoio do BES poderia ser feito através de um abatimento à conta de 23 mil euros que o PCP teria de pagar. Ora, este tipo de apoio, classificado como um donativo indirecto, também é proibido por lei. “É vedado aos partidos políticos: (…) receber ou aceitar quaisquer contribuições ou donativos indirectos que se traduzam no pagamento por terceiros de despesas que àqueles aproveitem”, diz a lei.
O PÚBLICO contactou o porta-voz do Novo Banco, que nunca atendeu, e o director do Departamento de Municípios e Institucionais, Pedro Espírito Santo da Cunha, cujo gabinete respondeu que não tinha disponibilidade para prestar esclarecimentos.
Questionada pelo PÚBLICO sobre a existência, em anos anteriores, de “donativos” deste género à Festa do Avante!, a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, encarregada de fiscalizar as contas dos partidos e das campanhas eleitorais, limitou-se a responder que “se houve ou tivesse havido donativos de pessoas colectivas, a entidade teria imediatamente feito uma queixa-crime ao Ministério Público”.